As estradas falam, a Mercedes-Benz ouve

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Roberto Leoncini, vice-presidente da Mercedes-Benz

Roberto Leoncini, vice-presidente da Mercedes-Benz

O vice-presidente de vendas e marketing da Mercedes-Benz do Brasil, Roberto Leoncini, garante que estar afinado com o mercado é a melhor forma para definir os rumos da empresa. Confiante nessa estratégia, a fabricante planeja usar de toda a criatividade para implantar novos modelos de estruturas de atendimento, mais flexíveis, que garantam o pronto atendimento nas regiões onde a movimentação de cargas está mais intensa, como as novas fronteiras agrícolas. Novos serviços e linhas de produtos adaptados à realidade brasileira são apelos para a conquista de mais market share. Vamos às novidades!

Primeiramente, vamos fazer um breve balanço do ano passado. O mercado nacional de caminhões, conforme dados estatísticos de entidades ligadas ao setor, apresentou uma queda de 11,3%, enquanto na Mercedes-Benz a queda foi de 6,8%. Qual é a sua avaliação sobre esse resultado?

Roberto Leoncini • A Mercedes fez uma grande lição de casa principalmente com relação a novidades. Durante 2014 apresentamos ao mercado melhorias tanto no Actros como no Axor e no Atego, tudo debaixo do guarda-chuva do Econfort, e isso teve uma percepção pelo mercado de uma melhora pelos transportadores, principalmente em relação a desempenho, baixo consumo de combustível, mais conforto para o motorista, medidas que contribuíram para um ganho de market share. Além de uma queda menor, conseguimos crescer aproximadamente de 1,3%, quase chegando a 26% de participação do mercado de caminhões. Isso nos deu o retorno da direção correta. Ainda não conseguimos mostrar esses ganhos para todo mundo porque muitas das novidades afetam especialmente o motorista com relação a conforto e ao transportador no que diz respeito a consumo de combustível. Isso leva um tempo para chegar lá na ponta para todos.

Então a ordem é aperfeiçoar mais ainda o que é possível nas linhas já existentes para atender as demandas dos transportadores?

Leoncini • Exatamente. Fizemos muitas modificações, mais de 40 modificações nos modelos e agora temos que mostrar isso para o mercado. Então em 2015 devemos chegar mais perto do mercado, fazer mais eventos com motoristas e destacar as melhorias. Então, nosso mantra daqui para frente é: “as estradas falam, a Mercedes-Benz ouve”. 

Entre as modificações feitas, quais são as mais importantes para levar a Mercedes a fazer a diferença no mercado?

Leoncini • Eu acho que, com relação aos caminhões pesados, é o fato de disponibilizarmos eixos sem redução no cubo, o freio a tambor, a automatização no Atego, o modelo 2430 com câmbio automatizado, esses são exemplos que estão fazendo a diferença. No segmento de pesados, esse eixo sem redução no cubo era uma demanda do mercado, bem como os freios a tambor. O Actros, agora, a partir de janeiro, será nacionalizado, podendo ter acesso ao Finame como qualquer produto da concorrência. Tudo isso vai colocar a Mercedes no lugar de liderança em que merece estar.

Você citou que a Mercedes atingiu quase 26% de market share em 2014, e neste ano qual é a expectativa?

Leoncini • Nesse ano, o nosso trabalho vai ser de sustentar isso, porque, com 26% ou um pouco mais, a marca já se coloca, teoricamente, como líder de mercado. O objetivo é trazer a empresa para uma posição em que ela já esteve e ser uma boa opção para os transportadores, operadores e autônomos de todo o Brasil. Vamos estar mais perto. 

Qual é o tamanho da rede hoje?

Leoncini •  Temos 184 pontos de vendas e atendimento. Devo ressaltar que estamos conversando com a rede também sobre uma melhor atenção ao segmento de extrapesados que tem uma demanda e características diferentes dos outros modelos. Eles atuam em regiões onde o agronegócio vem expandindo as fronteiras, o que implica na ampliação da cobertura de todo esse segmento. Também precisamos de instalações mais flexíveis e fora do usual. 

Isso significa que a concessionária poderá ter atendimento móvel ou in house?

Leoncini • Isso significa que podemos utilizar um site de algum operador logístico que tenha grandes instalações, grandes pátios etc. Então podemos estar dentro desse operador, do lado dele, com um dealer que tenha infraestrutura de atendimento e que em 60 dias, por exemplo, possa começar a atender ao cliente. Não tem mais um modelo quadrado que você tem que seguir o manual. Suponho que a rede deverá crescer entre 10% e 15% nos próximos dois anos. O que importa é que um cliente não pode levar mais de uma hora e meia para ser atendido.

Você está falando de operadores logísticos?

Leoncini • Estamos falando de operadores logísticos e transportadores que atuem nessas novas fronteiras agrícolas e tenham frotas de 1 500 a 2 000 caminhões, por exemplo. Cada dealer deve atender no seu território específico. O que estamos mostrando a eles é onde há oportunidade, onde é melhor ter um modelo mais flexível, uma realocação ou uma estrutura exclusiva só para atender Sprinter e Accelo, por exemplo. O concessionário agora tem que ter criatividade, disponibilidade de modelos diversos para atender cada tipo de público e segmento e, principalmente, para identificar onde esses modelos flexíveis devem estar.  Por exemplo, o cliente da Sprinter não vai sair de mais de 50 km do centro urbano para ser atendido, ele vai procurar alguém mais próximo dele. E o caminhão pesado de 9 eixos não vai entrar na cidade para ser atendido. Por isso é preciso criatividade e modelos distintos..

Esse planejamento é ideal para as novas fronteiras agrícolas, certo? 

Leoncini • Certo. Estamos falando das regiões centro-oeste e norte. A soja já não vai mais sair do Mato Grosso para Paranaguá, agora cerca de 50% da produção destes Estados centrais devem ser escoadas pelo Pará. A Cargill, ADM já estão fazendo portos de rio, e de lá a carga seguirá para o Norte para exportação.
Pelos números da Fenabrave, a Mercedes-Benz liderou o mercado de 2014. Pelos da Anfavea, ficou em segundo lugar.

Considerando que ambos os rankings são baseados nos dados de emplacamento do Denatran, como explicar essa diferença?
 
Leoncini • A Fenabrave tem uma metodologia diferente da usada pela Anfavea. Por exemplo, ela considera que Volkswagen e MAN são duas empresas diferentes e também tem uma classificação diferente para os modelos como a Sprinter, por exemplo. Mas o que interessa para a Mercedes é que se a gente somar 34 311 caminhões, mais 13 006 ônibus, mais 9 563 Sprinter, nós emplacamos mais veículos comerciais do que qualquer outra montadora do Brasil. Eu particularmente acho que nossa grande vantagem é oferecer uma solução completa dentro de nosso portfólio podendo atender desde o extrapesado ao carro, se necessário, para atender nossos clientes. É assim que eu prefiro ver. Sei que existem essas estatísticas, são ótimas, mas a Mercedes tem que trabalhar para ser uma fornecedora de soluções logísticas. Eu quero chegar ao cliente, ouvir sua necessidade e oferecer desde o transporte de funcionários que possa ser resolvido com uma Sprinter, até ao seu serviço que exija um extrapesado.

Quanto a Mercedes cresceu exatamente em 2014 em cada segmento?
 

Leoncini • Em caminhões crescemos 1,3%. Saímos de um pouco mais de 24% e fomos para 25,8% (em participação de mercado). O leve é o segmento mais suscetível ao que acontece na economia. É o segmento dos autônomos, dos pequenos negócios, das pequenas transportadoras e que numa incerteza de política econômica é o primeiro a sentir a pancada. É o que mais caiu em relação a 2013, em torno de 16%, contudo conseguimos manter nosso market share, apesar da queda de 31,9% para os atuais 31,6% em 2014. O Accelo é um produto que vem sendo bem reconhecido no transporte urbano e o responsável pela manutenção de nosso market share. O médio, ao longo dos anos, vem sendo achatado nos últimos anos e vendeu em 2014 em torno de 9 mil unidades. Nós caímos de 29% para 20% no market share. A explicação é que esse setor é predominantemente dominado pela indústria de bebidas. Aí você nota que o modelo 1119 da Ford é um caminhão leve, porém, como recebeu um terceiro eixo, foi classificado como médio pela Anfavea. Isso também derrubou bastante market share de todo mundo. Portanto esse setor é muito sensível. Se você perde um negócio, que em geral é de 300 a 500 caminhões, impacta o todo. O mercado de semipesados caiu 11% no geral e nós caímos 7%. Conseguimos ganhar um pouco de market share. Ganhamos um pouco de participação no mercado, ficando com 27,5%. Isso já é reflexo do Econfort e do Atego, que recebeu muitas melhorias. Nesse segmento temos o Atron, um modelo mais despojado, bicudo, mas ainda bem-aceito em alguns mercados do Brasil. Quando você começa a fatiar o mercado regionalmente, você nota uma resistência pelo modelo bicudo, mas como é o único, ainda tem mercado. O extrapesado caiu 11% também no geral, mas para a Mercedes foi bom, porque crescemos 4%. Outra razão foi o ganho de algumas licitações de governos. O segmento off-road nos garantiu 45,8% de market share. No rodoviário, a gente vem crescendo com o Axor, não o que gostaríamos, mas, com todas as modificações feitas, devemos colher os resultados em 2015.

Qual a expectativa para 2015, considerando as novas regras do Finame? 

Leoncini • Vou ser supersincero: não sei. As regras ainda não foram publicadas e não saiu a nova circular do BNDES. A notícia pegou todo mundo no apagar das luzes de 2014, em que as empresas estavam desligando. Agora é que devemos retornar às discussões. Vou ligar para uns cinco, seis amigos transportadores e perguntar o que eles acharam. A primeira impressão é que não é ruim; capacidade de carga a gente tem, mas acho que, com o nível de entrada, vamos começar a ver muitos seminovos e usados no meio das transações. Posso estar  errado, mas é uma impressão. Uma coisa é certa, o transportador não faz compras, independentemente da taxa de juros, se não tiver um contrato respaldando. Vai depender muito do que vai acontecer com os grandes geradores de cargas. Outra avaliação é a expectativa de que o agronegócio pode crescer e não haverá tanta pressão, porque, com o programa de incentivo do governo, novos silos foram construídos, aumentondo a capacidade de armazenagem. Os produtores podem esperar pelo melhor momento de vender e isso pode tirar a pressão do transporte. Outro fator é que, com isso, a produtividade do caminhão se torne maior, porque não precisa ficar esperando com carga.

Todas as marcas batem em nas mesmas teclas: baixo consumo e custo operacional, durabilidade, serviço de pós-vendas e alta disponibilidade de peças etc. Como se destacar em um mercado tão competitivo e profissionalizado como o de hoje?
 

Leoncini • Todo mundo fala que oferece as mesmas coisas aos clientes. A grande diferença implica em você estar do lado do cliente efetivamente. Se você tem pessoas capazes de interpretar as necessidades dele e trazê-las para dentro da fábrica e internamente poder apresentar boas soluções. Esse é o grande diferencial, porque falar de consumo, reposição de peças, de treinamento e etc. para o nível das transportadoras de hoje é obrigação. Se a montadora não tem um nível de excelência em todos esses quesitos, a marca acaba tendo uma série de problemas, como algumas que têm sérios problemas no mercado. O que vale é a sintonia fina com o mercado. A Mercedes tem 184 pontos de atendimento, cinco escritórios regionais com profissionais escutando o mercado, porque no Brasil cada região tem  público diferente, com realidades diferentes. Não adianta a gente falar que o que serve para o transportador no Rio Grande do Sul serve para o da Paraíba também. Eu aposto na oferta de uma estrutura bem completa nos escritórios regionais que permite oferecer serviços e captar o que é bom para cada cliente. Quando falo em serviços, destacamos as peças genuínas Mercedes-Benz, as remanufaturadas Renov e as peças originais Alliance, como a segunda marca de peças. Temos oficinas em sites, contratos de manutenção, oficina dentro do cliente, o banco e o Fleetboard, um serviço de telemetria a ser lançado em breve. Não tenho essa divisão agora. Posso lhe dizer que uma novidade lançada em 2013 e em 2014 vendeu 380 seminovos e fez quase 1 800 avaliações de caminhões. Esse serviço já virou referência. Às vezes vou lá e vejo autônomos perguntando dos caminhões. Agora pensamos em crescer, acho que o SelecTrucks não devem ficar só em São Paulo. Sabemos quais os mercados potenciais para implantação, por exemplo, Minas Gerais, Paraná. Vamos avaliar melhor.

Volvo, Scania e Iveco têm adotado estratégias de produtos na mesma geração que as vendidas na Europa, com exceção do motor aqui ser Euro 5 e lá Euro 6. A Mercedes-Benz tem uma estratégia de trabalhar com uma geração atrás da europeia, como é o caso do New Actros, Atego e Arocs. Como a empresa pensa a curto, médio e longo prazo sobre isso?
 

Leoncini • A nossa estratégia é a de apresentar o melhor custo de operação em todos os segmentos. Os produtos que temos hoje, por exemplo, o Axor, só existem aqui no Brasil. O Atego e o Accelo também estão em uma geração anterior. Vamos supor que vamos trazer o New Actros para cá, Euro 6, cheio de eletrônica, mas por quê? A única razão que eu vejo para “comunizar” a produção e ter um modelo global significa que deveríamos atender o mercado alemão por exemplo. A Mercedes europeia tem capacidade suficiente para atender a Europa. Então nossa estratégia é fazer os produtos de acordo com a realidade daqui, com as modificações que foram feitas e com custos operacionais melhores. Em longo prazo pode-se até ter produtos comuns, mas no momento cada modelo está adequado à realidade local. Seria o mesmo que dizer que teríamos que introduzir um New Actros nos Estados Unidos. O cliente brasileiro não está perdendo nada por ter um caminhão com uma geração anterior. No final, eixo, suspensão, economia de combustível são os mesmos. Acho que a grande vantagem de se ter produtos daqui é a grande flexibilidade que temos de pedir à engenharia de promover melhorias para o mercado brasileiro.