Em 2013, a edição 116 da revista trouxe um especial sobre os caminhões ‘verdes’ do mercado brasileiro. Conheça os modelos e suas características, em mais uma matéria da série Baú da TRANSPORTE MUNDIAL.
Há cerca de cinco anos, falar sobre o desenvolvimento de caminhões no Brasil com apelo sustentável – leia-se movidos com combustível alternativo ao diesel – parecia ser algo muito distante. Seria um engano! Apesar de o critério ‘custos operacionais’ ainda ser a maior exigência do mercado, há empresas que querem unir esse conceito a prática sustentável, passando a ser este um dos novos desafios das equipes de engenharia das montadoras. E foi em 2009 que tudo começou a mudar nesse sentido.
A Iveco foi a pioneira e apresentou aquele que seria a primeira solução para a mobilidade sustentável no país. O Iveco Daily Elétrico, movido à energia limpa e renovável, foi desenvolvido em parceria entre a Iveco e a Itaipu Binacional. E por se tratar de um veículo totalmente livre de emissões de poluentes, no mesmo ano de seu lançamento recebeu o prêmio Destaque Tecnológico do Congresso SAE Brasil 2009.
O modelo eleito foi o Iveco Daily 55C, com 3 750 mm de entre-eixos, chassi cabine dupla que permite o transporte de 6 passageiros e que na versão elétrica ganhou a denominação 55C/E. Nessa versão ele possui 108 cv de potência e torque de 30,6 mkgf. A tração é traseira e sua capacidade de carga útil é de até 2,5 t, obtendo uma velocidade máxima de 70 km/h. O 55C/E funciona com 3 baterias de sódio, níquel e cádmio, de 165 kg cada, e tem uma autonomia de 100 km. As baterias levam 8 horas para carregar e têm uma vida útil de mil ciclos de recarga. Seus componentes são totalmente recicláveis.
O modelo é uma alternativa no transporte urbano como serviços municipais e de coleta e entrega. Dirigir o Daily Elétrico é semelhante a um veículo automático. Existem apenas os pedais do acelerador e do freio. Uma alavanca de câmbio indica as posições à frente, ponto morto e ré. Para andar, basta girar uma chave no painel, colocar a alavanca na posição à frente e acelerar.
O display digital no painel é bem diferente ao do modelo convencional. Suas informações indicam, por exemplo, a carga, a corrente e a voltagem das baterias, a temperatura do motor elétrico e a marcha engatada.
PARA CHAMAR DE LIMPO
No ano de 2010 foi a vez da Mercedes-Benz mostrar o seu caminhão sustentável Accelo BlueTec EEV, movido 100% a diesel de cana. O caminhão foi desenvolvido com base em um conceito mundial levado muito a sério pela fabricante da estrela, segundo o qual cada país tem como missão desenvolver a tecnologia que melhor se adapta às condições de seu mercado. E a engenharia brasileira assim o fez. A Mercedes-Benz começou a avaliar o comportamento do diesel de cana em seus propulsores, resultando no Accelo BlueTec EEV (Enhanced environmentally friendly vehicle, sigla que corresponde a veículos excepcionalmente compatíveis com o meio ambiente). Significa que o caminhão ultrapassa as exigências ambientais europeias – que até este ano, assim como no Brasil com a Proconve P7, atende às exigências da norma Euro 5.

Em teste realizado com o modelo pela revista Transporte Mundial, na edição nº 97, julho de 2011, pela rota de 232 quilômetros de São Paulo a Peruíbe, o Accelo BlueTec emitiu apenas 10% do total de particulados permitidos pela Controlar (empresa de inspeção ambiental veicular). Outra boa notícia foi o resultado de consumo, de 5,5 km/l.
O Accelo sustentável foi concebido levando em conta a conservação de recursos, redução de emissões e a segurança no transporte. É equipado com freios a disco nas quatro rodas e freios ABS. Os materiais utilizados na produção da cabine são totalmente recicláveis e, para se ter uma ideia, o tecido dos bancos foi produzido com fios compostos por garrafas pet.
O motor OM-924 LA possui 4,8 litros e potência de 185 cv a 2 200 rpm e torque de 71 mkgf entre 1 200 e 1 600 rpm que trabalha em conjunto com o câmbio G56 de 6 velocidades, sendo a última overdrive. O propulsor abastecido de diesel de cana garante 90% de redução nas emissões de gases de efeito estufa e 33% de redução de material particulado se comparado aos caminhões P7.
Torná-lo possível no mercado depende mesmo de vontade política para criar ações que incentivem a produção do diesel de cana em larga escala. Já no que se refere à tecnologia, a Mercedes-Benz garante que seu Accelo EEV tem condições de ser colocado no mercado, uma vez que compartilha do mesmo sistema de produção dos modelos tradicionais da família.
2011: O ANO DOS PESADOS
Pegando carona naquele que seria o principal combustível renovável do país, no ano de 2011 foi a vez da Scania introduzir um caminhão sustentável. Esse foi o primeiro veículo semipesado com esse apelo. Trata-se do P 270 movido a etanol. A iniciativa veio depois de a marca do grifo ter vendido 50 ônibus movidos a etanol para a cidade de São Paulo.
A fabricante lançou o semipesado equipado com o mesmo motor de 270 cv dos ônibus, que funciona em ciclo diesel alimentado pela mistura de 95% de etanol hidratado com 5% de aditivo para controlar a combustão. Eleger o motor ciclo Diesel para operar com o etanol foi por questão de robustez, necessária ao transporte, sobretudo com veículos pesados. O motor é o DC9 produzido pela Scania. Possui 5 cilindros em linha e tem potência de 270 cv a 1 900 rpm e torque de 122,4 mkgf de 1 100 a 1 400 rpm.
Ao apresentá-lo ao mercado, a Scania pretende oferecer uma opção às empresas que querem ter sua imagem associada à sustentabilidade, além de setores em potencial que o veículo poderia ser um bom negócio no que tange a custos operacionais, como usinas produtoras de álcool.
O ganho maior do P 270 está na redução de 90% das emissões de CO2 se comparar a um caminhão diesel que atende a norma P7. Uma boa notícia é que existe uma empresa que produz o aditivo necessário para misturar ao etanol. Com isso, o empresário que queira ter um Scania P 270 na frota, basta possuir uma central de abastecimento do etanol misturado ao aditivo. A Scania informa que o P 270 etanol pode ser encomendado em quaisquer das seguintes configurações: 4×2 cavalo-mecânico e o 6×2, 6×4 e 8×2 rígidos. Um opcional é o câmbio Opticruise (automatizado).
OFF BI-FUEL
Foi também em 2011 que a Iveco ousou e colocou no mercado o Trakker Bi-Fuel Ethanol-Diesel, cavalo-mecânico que utiliza etanol para substituir parte do consumo de óleo diesel, primeiro modelo bi-combustível entre caminhões. Desenvolvido a partir de uma demanda da Unica (União da Indústria da Cana-de-Açúcar), o caminhão pode ser utilizado em várias aplicações do setor canavieiro, pois é um cavalo com tração 6×4 com PBTC (Peso Bruto Total Combinado) para até 63 t.
Em média, o caminhão opera com a substituição de 40% do diesel pelo etanol. No entanto, a central eletrônica do veículo faz a dosagem correta dos combustíveis – quando necessário, ela aumenta a proporção para até 85% do derivado de cana.
O funcionamento do sistema de propulsão segue os preceitos dos motores convencionais de ciclo Diesel. Após a compressão do ar e do etanol, a combustão acontece com a injeção do próprio diesel. Tudo isso, ocorre dentro do motor Iveco-FPT de 6 cilindros e 9 litros, que chega a desenvolver 360 cv de potência. Ele ainda é dotado de injeção common rail. O câmbio é ZF de 16 velocidades, sendo a última overdrive.
O Iveco Trakker Bi-Fuel já teve sua tecnologia reconhecida pelo importante prêmio Top Etanol, concedido pela Unica.
A tecnologia do Trakker foi desenvolvida pela Iveco, FTP Industrial, Bosch e Raízen (joint-venture entre Shell e Cosan). E a fase de testes mais intensos já foi concluída. Hoje o veículo está sendo utilizado em algumas usinas e pode ser comprado normalmente.
O “GÁS” ITALIANO
A Iveco é a montadora que no Brasil que tem apresentado muitas soluções sustentáveis e todas elas disponíveis aos transportadores. No final do ano passado, a italiana apresentou três modelos movidos a GNV (Gás Natural Veicular). Começando pela família Daily de veículos semileves, a Iveco disponibiliza dois modelos 35S14G – versões furgão e chassi-cabine – indicadas para o transporte urbano. Ambos os modelos já estão sendo utilizados, ainda em avaliação, pela Patrus Transportes, em Minas Gerais, e pela Trafti Transportes, em São Paulo. O veículo é equipado com motor FPT F1C GNV, de 136 cv de potência e 35,7 mkfg de torque que trabalha em harmonia com a transmissão manual FPT 2840.6 de 6 marchas.
O modelo Furgão Daily que está com a Patrus, faz parte de uma parceria entre a BHTrans (Empresa de Transporte e Trânsito de Belo Horizonte), Gasmig, Fetcemg/Setcemg e UFMG, que firmaram o compromisso de fazer testes de tecnologias alternativas de combustíveis. Já a versão chassi-cabine está sendo avaliada pela Trafti em parceria com a Comgás, sendo utilizado para o serviço de Home Personal Care & Foods, com o mesmo objetivo, reduzir a emissão de carbono e melhorar a mobilidade e a qualidade do trânsito nas grandes capitais.
Outro veículo movido a GNV é o Tector 170E20G AT. Essa versão será utilizada para a coleta de lixo em uma parceria firmada entre a Iveco, a Comgás e a Vega Ambiental, ambas de São Paulo. O câmbio deste caminhão é automatizado. Além desses veículos, a Iveco também possui outro modelo de caminhão, dotado com a tecnologia GNV, que já está rodando em Porto Alegre (RS). Trata-se do Iveco Tector 170E20G, na aplicação de coleta de lixo.
Com 16 toneladas de PBT (Peso Bruto Total), o Iveco Tector é equipado com um motor Iveco-FPT NEF 6, de 6 cilindros, 126 m³ de gás e autonomia para rodar até 350 quilômetros. Esse veículo, que já está preparado para ser abastecido com biometano – combustível renovável com um conteúdo de energia e composição química semelhante à do gás natural -, já está em fase de testes na Sulgás, Companhia de Gás de Porto Alegre (RS), e na DMLU (Departamento Municipal de Limpeza Urbana) do Rio Grande do Sul. Os testes fazem parte de um projeto de desenvolvimento do mercado de gás natural veicular para veículos pesados, promovido pela Iveco, Sulgás, Revita Engenharia Ambiental e DMLU.
HÍBRIDO DA MAN
O protótipo do caminhão Volkswagen Constellation 17.280 configurado 6×2 híbrido é um modelo direcionado para aplicação na coleta de lixo, por exemplo, já que a redução do consumo de combustível pode chegar a 15%, com consequente queda nas emissões de gás carbônico (CO2), de acordo com a engenharia da MAN Latin America.
O VW traz o mesmo conceito de recuperação da energia cinética (KERS) utilizado nos carros da Fórmula 1. O sistema armazena em acumuladores hidráulicos a energia coletada durante a frenagem, usando-a posteriormente na partida do veículo. Por essa razão, é indicado para operações em que o veículo está submetido a uma aplicação “anda e para”, como a de coleta de lixo ou o transporte público.
Um dos maiores diferenciais do híbrido da MAN Latin America em relação aos modelos que existem mundo afora está no dispositivo de armazenagem de energia utilizado nesse veículo. Os outros sistemas utilizam baterias ou ultracapacitores, mas a fabricante de origem alemã optou pela opção de acumuladores hidráulicos pela maior adequação à realidade brasileira.
O principal benefício está na manutenção e operação mais simples do sistema, cuja durabilidade é maior do que a da bateria. A empresa também prevê um menor investimento inicial para aquisição do modelo do que os observados mundialmente em híbridos elétricos. O acumulador hidráulico tem uma capacidade de resposta mais rápida, ou seja, disponibiliza toda a energia armazenada para partida do veículo instantaneamente.
O sistema do híbrido com tecnologia diesel/hidráulica foi desenvolvido pela MAN Latin America, em parceria com a Bosch Rexroth. Esse modelo foi apresentado durante a Fenatran em 2011 e também está sendo avaliados por clientes.