Com a apresentação na última Fenatran do Volkswagen e-Delivery, o Brasil mostra sua capacidade de participar de uma tendência mundial na eletrificação de veículos, principalmente, de comerciais de carga e passageiro. Antes, vale lembra que a Iveco apresentou o primeiro caminhão brasileiro elétrico em meados de 2009.
De um ou dois anos para cá, cidades europeias falam em aumentar as restrições aos veículos a combustão. O objetivo e forçar o uso dos veículos elétricos, porém, ainda sem uma análise mais profunda das consequências disso. É uma decisão política.
Desafios tecnológicos, ambientais e econômicos precisam ser vencidos para a viabilidade da mobilidade elétrica. Por enquanto, o que vemos no mundo, são ensaios acessíveis apenas as elites econômicas (países ricos). Vamos as perguntas que precisam ser respondidas:
Qual a viabilidade econômica?
Quanto vai custar o caminhão elétrico? As baterias ainda são muito caras e o barateamento no futuro é apenas uma esperança. Vários construtores dizem que, em média, elas representam 50% do valor do veículo. Atualmente, o automóvel elétrico custa o dobro, as vezes mais do que o dobro, quando comparado a um modelo similar convencional. Veja o sedã que a BYD está vendendo no Brasil por R$ 230 mil. Um sedã similar com motor a flex (etanol e gasolina) custa menos do que R$ 100 mil.
O VW Delivery 9.160 a diesel custa R$ 171.683, segundo tabela da Molicar de outubro de 2017. A MAN Latin America ainda não divulgou o preço do e-Delivery. Mas se seguirmos a lógica dos automóveis, podemos estimar que e-Delivery custará mais de R$ 343 mil.
O fabricante diz que, apesar do investimento inicial maior, o retorno vem da economia com manutenção e combustível. É verdade que não há o motor a combustão para dar manutenção. Mas as baterias terão que ser trocadas entre 5 e 10 anos ao custo de um caminhão similar a diesel zero quilômetro?
A experiência da Eletra, parceira no projeto do e-Delivery e fabricante dos ônibus elétricos que rodam em São Paulo, é de que as baterias têm uma vida útil de cinco anos devido ao uso intenso, o que é muito pouco para fechar a conta.
Sobre a energia elétrica, vale lembrar também que a nossa está cada vez mais cara por causa da falta de infraestrutura. No segundo semestre de 2017, a bandeira vermelha 2 teve um aumento de 43%. O custo da energia elétrica, no futuro, pode mudar. Só não sabemos se para melhor ou para pior e quando?
Muitas contas ainda precisam ser feitas para sabermos se elas fecham. Muitos defendem subsídio do governo para viabilizar os veículos elétricos. Mas como dar subsídio com áreas prioritárias como saúde, educação e segurança pública falidas? A iniciativa privada e o consumidor precisarão bancar a conta, mas sabemos que não querem ou não podem. Países europeus com renda per capita de R$ 190 mil/ano estão dando subsídios que seus cidadãos comprem automóveis elétricos. Um dos países da Europa reduziu o subsídio e as vendas de carros elétricos caíram mais de 50%. Será que nós, brasileiros com renda per capita de R$ 30 mil/ano, teremos condições de bancar a conta?
Vale lembrar que, no rico Estados Unidos, somente empresas grandes e ricas têm conseguido comprar caminhões híbridos (mais barato do que o 100% elétrico), feitos com motores a combustão movido por combustíveis alternativos e motores elétricos. A Fedex é uma dessas empresas que investe bastante em veículos alternativos. Porém, a maior parte da frota da Fedex ainda é movida a diesel e outros combustíveis fósseis.
Assim, o que podemos imaginar é que caminhões elétricos será, por enquanto, para empresas ricas e que precisam fazer uma boa imagem de sustentabilidade ambiental. Para o transportador brasileiro, com margens achatadas devido ao frete defasado, é uma realidade ainda distante. A melhoria da eficiência logística pode ajudar a pagar a conta, mas por outro lado, o crescimento do roubo de carga tem aumentado os custos das transportadoras com sistemas de segurança.
Quais os ganhos ambientais?
Se analisarmos que o caminhão elétrico não emite os poluentes que os combustíveis fósseis emitem, há um grande ganho ambiental. Porém, se milhões e milhões de baterias forem produzidas, daremos conta de reciclá-las? Vale ressaltar que as melhores baterias que conhecemos hoje são feitas de lítio. De acordo com o Manual do Lítio e Cálcio na Natureza, “o lítio é um elemento relativamente raro, embora ele seja encontrado em muitas rochas e algumas salmouras, mas, sempre em escassas concentrações”. Vamos lembrar também que diversas outras indústrias utilizam o lítio, inclusiva a farmacêutica. Assim, teremos lítio para quantas baterias e por quantos anos? A indústria precisa responder qual o impacto na natureza com a produção de grandes baterias em escala mundial? Lógico que se descobrirem uma nova tecnologia para armazenar energia, tudo muda de figura e nova realidade será construída. Mas a curto e médio prazo, não há nada em vista.
Muitos engenheiros da indústria automotiva ainda defendem que o Brasil tem fontes alternativas de combustíveis, como etanol, diesel de cana de açúcar, biodiesel e gás natural, com reduzido impacto ambiental e melhor viabilidade econômica do que os veículos elétricos. Para longo prazo, pesquisadores defendem a célula de combustível tendo o etanol como fonte e vapor d’água como resultado de emissão. Mas as pesquisas precisam avançarem muito, pois estamos mais próximo da estaca zero do que de alguma previsibilidade de prazo.
No mais, os caminhões Euro 6 já estão muito próximo da emissão zero se comparado com os caminhões Euro 0. A maior parte da frota brasileira ainda é de Euro 0 e a principal causadora das emissões medidas atualmente. As duas coisas precisam andar juntas: renovação de frota e introdução de tecnologias limpas.
Qual autonomia será a mesma depois de três anos?
Os caminhões apresentados mundo afora têm autonomia de 100 km a 200 km. Esta autonomia vai reduzindo com o passar do tempo e uso, principalmente, com o peso sobre o caminhão. Qual a autonomia da bateria depois de três anos de intenso uso?
Os projetos devem seguir?
Com certeza. Os fabricantes de caminhões estão esforçando para dar resposta às exigências por uma mobilidade limpa e investimento no desenvolvimento de diversas tecnologias alternativas ao combustível fóssil. O caminhão elétrico é apenas uma delas. Muito provavelmente, ele seja uma realidade para empresas muitas ricas e dispostas a bancar o custo sem repassar para o consumidor final de seus produtos e, também, apenas para uso restrito às entregas urbanas e curtas distâncias, o que, devemos concordar, já será um ganho para as cidades. A Tesla também está no jogo.
Parabéns para MAN Latin America no esforço de desenvolver o e-Delivery, para a Mercedes-Benz que no ano passou apresentou seu caminhão médio elétrico e-Truck, para a Cummins, que também está investindo no Aeos, e todos os fornecedores e engenheiros envolvidos nesses projetos e diversos outros para apresentarem caminhões e ônibus com emissão quase zero para reduzir ao máximo o impacto da mobilidade de pessoas e cargas. Aliás, por enquanto, mobilidade com emissão zero é somente andando à pé e descalço, pois a indústria de calçados também gera poluição.