O Brasil evoluiu pouco na adoção de uma política eficaz que mobilize a infraestrutura logística. Só assim é possível minimizar os custos da movimentação dos recursos produtivos. Tudo ainda está por fazer, com ressalvas para pequenos avanços pontuais. O problema, segundo Manoel de Andrade e Silva Reis, professor e coordenador do Celog (Centro de Estudos em Logística e Cadeias Produtivas) e também coordenador de Projetos da FGV (Fundação Getúlio Vargas) é a lentidão dos processos e a carga tributária. Para isso o governo deve deixar a posição paternalista de fazer tudo e permitir que a iniciativa privada tome conta do que sabe fazer.
Qual é o seu balanço sobre a infraestrutura logística? Entra e sai governo, e a situação se amarra na burocracia. Como sair desse ciclo?
Manoel Reis • Além da burocracia existem alguns fatores culturais que precisam ser combatidos e melhorados. Há o problema da infraestrutura em si, que é o de ter ou não capacidade para desenvolver o processo logístico. O que a gente nota é que houve um longo período no Brasil em que não se pensou de maneira estruturada e planejada com relação ao transporte e logística de um modo geral. O planejamento, ou foi feito de maneira muito pontual, resolvendo problemas locais, ou foi planejado de forma integrada, não foi algo que trouxesse um benefício efetivo. A privatização da operação das ferrovias é importante, até porque o governo federal não tem estrutura para operar processos produtivos.
O que está sendo feito de positivo?
MR • Em 2012 foi apresentado pelo governo federal, o PNLI (Plano Nacional de Logística Integrada), ou seja, um programa de investimentos em logística, rodovias e rerrovias, incluindo também portos, aeroportos etc. Pessoalmente, considero um bom plano. Mas o processo de operação tem sido difícil, a exemplo da privatização das ferrovias. Só se tem uma ferrovia competitiva na longa distância. Se a privatização se dá em blocos, eles acabam sendo geridos de uma forma individualista, impossibilitando a existência de trechos mais longos.
O que carece de melhoria nas concessões?
MR • Neste novo plano só se conseguiu fazer a concessão de algumas rodovias, em muitas delas não houve interessados. O governo federal relutou durante muito tempo em concordar com a concessão de sistemas públicos para a iniciativa privada. Resolveu fazer isso a partir de 2012 quando foram privatizadas algumas rodovias, só que o processo não foi bom. Pesou a burocracia e a forma de como conduziram as coisas. A iniciativa privada só vai colocar seus recursos em projetos que tenham lucratividade. O governo federal fez várias tentativas e ajustou o modelo de concessão para uma condição mais aceitável. Aí, algumas rodovias foram concedidas, bem como alguns aeroportos. As concessões para a construção de 10 000 km de ferrovias não foram iniciadas. O governo não conseguiu aprovar nenhuma PPP (Parceria Público Privada) até hoje.
Como ganhar competitividade logística, onde o caminhão detém importante participação?
MR • A frota de caminhões está velha, a produtividade é menor, e a manutenção, cara. Não se consegue trocar 1,6 milhão de caminhões de uma vez. Outra coisa é o frete baixo comparado com outros países. Isso implica na incapacidade de renovar a frota. A lei do motorista, mais a adequação aos motores Euro 5 podem baixar a produtividade das empresas. A diferença de valores dos fretes em relação a outros países é de 50% menos, bem baixo. O excesso de oferta de caminhões compete com fretes melhores.
Como estão os custos logísticos comparados com os de outros países ou parceiros de bloco, por exemplo?
MR • Elevados. Na Argentina, China e na maioria dos países europeus, os custos são menores. O Porto de Santos melhorou na operação de contêineres, mas continua o problema de dragagem do canal. Foi iniciado um programa de dragagem no valor de R$ 3,8 bilhões na melhoria da infraestrutura. Então temos problemas no canal para aportar navios maiores, de dragagem e nos acessos rodoviário e ferroviário, além dos cuidados ambientais. Mas não dá para fazer tudo de uma só vez. Cada caso precisa ser estudado, e a solução deve ser rápida.
No pico das safras vemos muios caminhões servindo de armazéns nas filas dos portos. Como acabar com isso?
MR • A conexão das ferrovias com os portos viabilizará a intermodalidade. Essa é uma saída. Não é possível que 25% da produção brasileira seja escoada pelo Porto de Santos e outro tanto, por Paranaguá abastecidos por caminhões. As filas estão associadas às dificuldades nos acessos, dos volumes transportados e com a capacidade de se colocar as cargas para dentro dos navios. O custo disso é altíssimo, mas será melhorado com alternativas de portos e vias de acesso para distribuir melhor a produção ao longo do país. O Porto de Açu está sendo feito, os portos do Nordeste vão absorver parte das cargas. Neste ano o Brasil vai produzir 100 milhões de toneladas de grãos e vai exportar 50% disso. Um navio médio leva 50 000 t, serão necessários 1 000 navios num período curto.
Seria preciso também construir armazéns para modular o escoamento, certo?
MR • Sim, temos um problema de falta de armazéns. Então isso obriga o produtor a vender rapidamente e mandar direto para o porto. Não existe uma área de estocagem intermediária. Seria uma forma de desafogar os portos e de o produtor criar um estoque regulador para vender com maior lucratividade. A construção de silos é mandatória.
As barreiras tributárias entre os Estados prejucam a logísitca. Como acabar com isso?
MR • O problema na logística chama-se tributo. Esse tributo chama-se ICMS por causa da independência dos Estados na formulação de suas políticas. É um tributo gerador de guerra fiscal que permite que cada um faça o que quer e não o que é bom para o país. Isso gera distorções e faz com que as cargas fiquem passeando desnecessariamente, elevando os custos. A adoção do IVA, usado por muitos países, inclusive pela Argentina, passa a arrecadação para o âmbito federal. Essa é uma batalha que os próximos governos terão que resolver.