Texto original: Gianenrico Griffini (presidente do comitê International Truck of The Year – ITOY, entidade que reúne 34 jornalistas de todos os continentes)

Tradução e adaptação para o contexto brasileiro: Marcos Villela – jornalista que representa o Brasil e a América do Sul no ITOY

Teste na vida real com um Freightliner Cascadia nos EUA, com uso de tecnologia inovadora que já é realidade no Brasil pelas empresas Ypê e Mercedes-Benz do Brasil. No caso brasileiro, o uso é em ambiente confinado, nos EUA, em rodovia pública (comentário do tradutor) 

A Daimler Truck planeja introduzir caminhões autônomos de produção em série nos Estados Unidos até 2030. O jornalista experiente Gianenrico Griffini teve um gostinho do que estava por vir quando subiu a bordo de um caminhão autônomo Freightliner Cascadia nas rodovias de Albuquerque (Novo México), EUA. (No final deste texto, conheça o artigo sobre o caminhão Mercedes-Benz Atego autônomo desenvolvido pela engenharia da fabricante no Brasil com um dos maiores indústrias de produtos de consumo doméstico brasileira, acréscimo do tradutor). 

Não precisamos esperar anos para ver caminhões autônomos nas vias públicas. Eles já são uma realidade nos Estados Unidos, com alguns protótipos baseados na plataforma Freightliner Cascadia. Construídos pela Daimler Truck North America, os caminhões de longa distância Classe 8, equipados com sistemas de direção automatizada de nível 4 (link sobre os cinco níveis definidos pela SAE, nota do tradutor), estão passando por testes de campo em condições reais de operação nas rodovias interestaduais ao redor de Albuquerque, Novo México. 

Albuquerque é a sede da Torc Robotics, empresa adquirida pela Daimler Truck em 2019. A Torc desenvolve o software, integra e funde as entradas de diferentes sensores, como câmeras, lasers, radares, entre outras tecnologias, para permitir uma direção automática segura em rodovias de alto nível (como a Rodovia Bandeirantes, Ayrton Senna e Castelo Branco no Brasil, como referências – nota do tradutor) com densidade de tráfego. Um radar de infravermelho é um dispositivo que mede a distância de um objeto por um feixe de laser e retorna informações tridimensionais de alta resolução sobre o ambiente circundante.

Na estrada a 65 mph (+105 km/h)

Os testes de validação não ocorrem em áreas confinadas, mas em rodovias com várias faixas de rolagem, com uma combinação com cavalo mecânico com implemento de três eixos, padrão de 80.000 libras (cerca de 36 toneladas) na velocidade máxima de cruzeiro permitida nos Estados Unidos de 65 milhas por hora (pouco menos de 105 quilômetros por hora). 

Por razões de segurança, durante os testes de estrada, um motorista de segurança humana, auxiliado por um engenheiro da Torc Robotics, está sempre pronto para assumir o controle total do caminhão articulado se surgir uma situação de risco (este é o nível 4. No nível 5, o veículo não tem o posto de motorista, não tem volante e nada para que um ser humano possa corrigir o erro para evitar um acidente, como já ocorreu em Las Vegas com o primeiro teste de um ônibus autônomo. O acidente pode ocorrer, e, é por isso que a Boeing e Airbus não criaram aviões 100% sem piloto, pois qualquer peça do veículo pode apresentar defeito). O motorista de segurança também tem um papel crucial em fornecer aos especialistas de software o feedback para programar o computador de bordo de acordo com um estilo de direção prudente, seguro e consciente do combustível, sem frenagens bruscas e acelerações bruscas.

Porque nos Estados Unidos

A decisão da Daimler Truck de desenvolver soluções de direção autônoma primeiro nos Estados Unidos depende de vários fatores. Em primeiro lugar, os Estados Unidos têm a rede de autoestradas mais ramificada e extensa do mundo, e a diferença de velocidade entre caminhões e carros não é tão alta quanto na UE. (Observação: nos EUA o transporte rodoviário e ferroviário são gigantes por uma questão de PIB e, por isso, mesmo sendo um país com boa infraestrutura ferroviária, o TRC tem uma responsabilidade proporcional maior do que no Brasil, no entanto, há um desenvolvimento maior sobre intermodalidade, acréscimo do tradutor). 

Além disso, as rodovias americanas representam um ambiente mais estruturado do que uma situação urbana. Existem pistas indo na mesma direção e é mais fácil prever para onde os carros devem seguir. Nesse ambiente, o Freightliner Cascadia pode lidar com a maioria das situações de tráfego: fusão de faixas, entrada no tráfego de uma rampa, mudança de faixa e desaceleração ou aceleração. A estrutura legislativa dos EUA também é favorável, pois a única contraparte dos fabricantes de caminhões é o Departamento de Transportes dos EUA (Dot), sendo proativo em facilitar a introdução de inovações técnicas.

Além disso, os veículos autônomos de dezoito rodas respondem a claros casos de negócios e necessidades de mercado, como um aumento contínuo na demanda de carga transportada por rodovias (um aumento de 30% é esperado até 2030) e uma crescente escassez de motoristas de veículos pesados. 

Conforme as estimativas da American Trucking Association, os empregos de motorista não preenchidos caíram para quase 78.000 unidades em 2022, uma queda de cerca de 4% em relação aos mais de 81.000 em 2021. Ainda é um número considerável que deve disparar – segundo a previsão da ATA – para mais de 160.000 unidades até 2031. Esse déficit se deve, entre outros motivos, ao expressivo número de aposentadorias e à incapacidade do setor de contratar mais mulheres, que representam 8% da força de trabalho total. 

Ao desenvolver soluções de direção autônoma para os Estados Unidos, a Daimler Truck se concentrou em um caso de negócios específico: conectar um centro de logística a outro (missão hub-to-hub) ao longo de uma rodovia. Quando o caminhão chega ao hub de destino, um motorista de caminhão profissional o leva até o ponto de descarga final. 

Em março de 2022, a Torc Robotics criou um conselho consultivo especial – TAAC, Torc Autonomous Advisory Council – com empresas líderes do setor, como Schneider, Covenant Logistics, Penske Truck Leasing e Ryder System, para fomentar a colaboração e entender melhor os desafios enfrentados por empresas de logística. 

A TAAC compreende os principais participantes do setor de frete que fornecerão orientação estratégica para a Torc à medida que ela se integra à rede de frete e enfrenta desafios além da condução em rodovias. O objetivo é introduzir veículos da série Nível 4 até 2030. A plataforma usada para desenvolver soluções de direção autônoma é o Freightliner Cascadia. Com um volume de vendas anual de cerca de 85.000 a 100.000 unidades em uma situação normal de mercado, é o trator Classe 8 mais vendido nos EUA.

Em 2022, a Freightliner detinha uma participação de mercado de 42% no segmento de veículos pesados, que atingiu um volume total de vendas no ano passado de mais de 254.000 veículos (em comparação com cerca de 222.000 unidades em 2021). 

Por questões de segurança, o Cascadia experimental possui muitos sistemas redundantes (como nos aviões). Existem sistemas redundantes (e independentes) para os freios de serviço, acionamento da direção, rede de transmissão de dados do veículo (CAN-Bus) e freio de estacionamento. (Observação: os sinais de internet precisam ser 100% eficientes. Se for 99.99999%, um acidente pode ocorrer, como já ocorreu com muitos carros da Tesla – acréscimo do tradutor).  

Os controladores primários e secundários do Sistema Eletrônico de Frenagem (EBS), em particular, oferecem controles precisos e confiáveis para desacelerar o caminhão e a carreta. Se o EBS primário encontrar alguma falha crítica, o EBS secundário assumirá o comando para executar um procedimento de segurança chamado Manobra de Risco Mínimo (MRM). Dois servomotores auxiliam eletronicamente a caixa de direção. Caso qualquer um dos servomotores sofra uma falha, a segunda unidade assume inteiramente para fornecer os comandos de direção necessários para executar o procedimento MRM. Finalmente, a proteção anti-hacker (segurança cibernética), sendo de suma importância no desenvolvimento de soluções de direção autônoma, foi totalmente abordada pelos engenheiros da Torc. Embora a Daimler Truck North America não tenha divulgado nenhum número sobre a previsão de vendas de veículos autônomos, ela espera que os veículos autônomos gerenciem 6% do volume de carga até o final desta década.

 

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Marcos Villela
Jornalista técnico e repórter especial no site e na revista Transporte Mundial. Além de caminhões, é apaixonado por motocicletas e economia! Foi coordenador de comunicação na TV Globo, assessor de imprensa na então Fiat Automóveis, hoje FCA, e editor-adjunto do Caderno de Veículos do Jornal Hoje Em Dia e O Debate, ambos de Belo Horizonte (MG).