Escutamos muito que há uma “indústria de multa” no Brasil, principalmente, de quem já foi multado. No entanto, o termo está errado. O que há é uma “indústria de arrecadação” e isso faz toda a diferença. Vamos entender o porquê.

dsc 0975
A fiscalização pode até fazer o trabalho dela, mas a legislação beneficia quem tem mais dinheiro e pune apenas quem tem menos. Foto: Arquivo

Ao sair na rua, basta observarmos o movimento dos veículos. Em pouco tempo vamos ver um monte de infrações impunes. São motoristas usando o celular com o agravante que antes eles apenas falavam e hoje digitam. Mudança de faixa de rolagem sem dar seta? Aos montes. E a freada só para passar pelo radar e depois acelerar em seguida? Quem nunca fez isso? Só o Alisson, um amigo que uma vez peguei carona com ele, respeitava até aquela placa de 60 km/h próximo ao posto da Polícia Rodoviária na estrada.

Portanto, se a fiscalização realmente fosse eficaz, duas coisas aconteceriam: as prefeituras e os estados ficariam muito ricos ou os brasileiros realmente passariam a ter educação no trânsito. A prefeitura de São Paulo arrecada mais de R$ 1 bilhão por ano em multas, porém, o potencial de arrecadação é muito maior. Diariamente podemos ver dezenas de pessoas dirigindo e usando o celular ao mesmo tempo sem punição. Mudança de faixa sem sinalizar então…

Quando o dinheiro fala mais alto

Agora vamos entender o termo arrecadação. A culpa está em que fez a legislação, que pune apenas financeiramente a classe média para baixo e que acaba apenas cumprindo uma função arrecadatória. Basta observar que as pessoas cometem uma infração, paga a multa, e volta a ter comportamento inadequado no trânsito. Graças à corrupção, muita gente consegue fugir da punição pelos pontos na CNH. Se não é pelo meio da corrupção, é por outros, como transferir os pontos para um necessitado de dinheiro (que não deixa de ser uma forma de corrupção) ou colocar o veículo em nome de uma empresa. Assim, paga-se o dobro do valor da multa, mas não leva pontos na carteira.

Há alguns anos, a própria CET-SP (Companhia de Engenharia de Tráfego de São Paulo) divulgou que o maior número de multas por veículo estava em carros com valor acima de R$ 150 mil. Esta informação leva a interpretação que pessoas com boa conta bancária se acham acima da lei e não se importam com as infrações de trânsito pois contam com diversos recursos para safar da punição da cassação da CNH.

O que precisa ser feito é mudar a forma de punir. A punição não deve ser paga apenas com dinheiro, mas, talvez, com tempo. O tempo é algo precioso para quem tem dinheiro. Um motorista rico que tiver que passar um dia inteiro em um trabalho forçado (podemos chamar de comunitário para ficar mais suave) vai pensar duas vezes antes de cometer uma infração. Sem isso, continuaremos sendo um país injusto, punindo somente quem tem menos renda.

Compartilhar
Marcos Villela
Jornalista técnico e repórter especial no site e na revista Transporte Mundial. Além de caminhões, é apaixonado por motocicletas e economia! Foi coordenador de comunicação na TV Globo, assessor de imprensa na então Fiat Automóveis, hoje FCA, e editor-adjunto do Caderno de Veículos do Jornal Hoje Em Dia e O Debate, ambos de Belo Horizonte (MG).