A jornalista e diretora editorial da revista FOCUS ON TRANSPORT AND LOGISTICS, da África do Sul, Charleen Clarke — minha colega no IToY (International Truck of the Year) como membro associado —, entrevistou o brasileiro que faz carreira internacional na Scania, Fabio Souza.
O executivo, que já foi diretor de serviços e MD (managing director) na Scania Brasil e promovido a e MD (managing director) na Scania South Africa como responsável por toda a área comercial naquele país e de outros países do continente africano. Logo após a imagem da capa da revista, confira a entrevista na íntegra com abordagem não só sobre a África, mas do Brasil com uma visão global do momento em vivemos e de 2021:

Cara a cara com Fabio Souza

Por Charleen Clarke*
FOCUS – Conte-nos um pouco sobre sua carreira e como ela o preparou para sua função atual como MD Scania Southern África?
FABIO SOUZA – Comecei minha carreira na Saint-Gobain no Brasil, inicialmente como trainee e depois como engenheiro de produto na divisão de abrasivos. Então, 19 anos atrás, me mudei para a Scania.
Passar 19 anos em uma empresa prepara você para tudo. Tive a oportunidade de trabalhar em três ambientes diferentes: uma região e depois dois países. A região foi a América Latina, onde fui analista de precificação de peças e depois chefe de precificação de peças.
Então me mudei para o México, onde fui gerente de serviço e diretor de serviço. Isso realmente me preparou para o próximo passo que dei em minha carreira. Foi, naquela época (em 2006), considerado um dos piores mercados para a Scania no mundo. Estávamos competindo com as marcas americanas. A Scania decidiu parar de produzir o caminhão T com capô, o que teve um efeito devastador.
Aprendi muito durante meus sete anos no México. Eu estava lá durante o surto de gripe suína. Não era nada comparado ao Covid-19, mas aprendi como lidar com pandemias, o que foi útil. O México era como Wuhan porque a doença começou ali. Naquela época, vendíamos apenas ônibus e o mercado de ônibus estava devastado. Tivemos que construir uma organização muito resiliente. Então veio a quebra do Lehman Brothers, que também teve um impacto enorme no México. Decidimos que precisávamos fazer algo diferente. Então, começamos o atendimento nas instalações do cliente. Isso era completamente novo na época e funcionou muito bem.
Em 2013, voltei para o Brasil, onde trabalhei como diretor de serviços na Scania. O Brasil não é um país para iniciantes. É o maior mercado único para a Scania no mundo, então você sente a pressão. Isso o torna mais forte; isso o torna mais resiliente. Também aprendi muito com o relacionamento com revendedores; quando você vê a empresa pelos olhos de um empresário independente, obtém uma nova visão. A eficiência é extremamente importante, e isso é algo que trago aqui.
FOCUS – Quais foram seus destaques profissionais e pessoais em sua carreira até agora?
FABIO – Do ponto de vista profissional, mudar da América Latina para morar no exterior tem sido uma oportunidade fantástica. Viver e trabalhar no exterior abre sua mente e o torna mais flexível. Mudar para o México foi um marco, assim como voltar para o Brasil. E agora, mudar para a África do Sul é ainda melhor. A experiência que você ganha trabalhando em mercados diversos e desafiadores como esses é altamente valiosa.
FOCUS – O que você esperava ao vir para a África do Sul? O que o atraiu em vir aqui? Como tem sido sua experiência real (em relação às suas expectativas)?

FABIO – Foi uma decisão relativamente fácil de tomar. Sim, eu estava em um mercado maior. No ano passado, entregamos mais de 2 300 veículos na África do Sul. No Brasil, entregamos cerca de 12.700. Mas também passei de diretor de serviço para MD. Esse foi o próximo passo natural em minha carreira. Achei uma excelente oportunidade. Existe a África do Sul, que é o mercado líder (no continente africano). No e,
ntanto, também temos nossos mercados estratégicos. Também somos responsáveis comerciais pela Namíbia, Botswana e Moçambique. Além disso, também temos os mercados independentes sob a estrutura da África Austral – Zâmbia, Zimbábue e Malawi. Essa variedade em nosso portfólio é muito interessante.
No Brasil, não trabalhamos no mercado de usados; os próprios operadores vendem seus caminhões. Portanto, não temos um departamento de caminhões usados na Scania Brasil. Aqui, é claro, é uma parte fundamental do negócio. Também não há departamento de aluguel na Scania Brasil.
Portanto, embora a África do Sul não seja tão grande quanto o Brasil, é muito mais complexo. A Covid significou tempos difíceis, mas também criou a oportunidade de recriar rapidamente. Mudei coisas em três meses que, provavelmente, levaria três anos para fazer. A Covid também nos uniu como uma equipe.
FOCUS – Resumidamente, como foi o desempenho da Scania South Africa em 2019 (em termos de volumes e participação de mercado)?
FABIO – Considerando que lançamos a nova geração de caminhões em meados de 2019 – resultando em uma imensa escassez de estoque no primeiro semestre do ano – eu diria que foi um ano muito decente para a Scania South Africa. Nossos volumes permaneceram estáveis - apesar dos desafios de estoque – assim como nossa participação de mercado.
FOCUS – Quais são seus objetivos para a empresa em 2020?
FABIO – Em minha opinião, teremos um nível elevado. A África do Sul é um mercado de 12.000 veículos comerciais pesados por ano. Acho que o mercado estará entre 9.000 e 10.000. Espero que os desvios como resultado do bloqueio tenham passado e que o mercado volte agora ao normal. Temos experimentado atrasos na introdução do produto no mercado. Na minha humilde opinião, reagimos muito rápido. Nós agimos. Tenho certeza de que, independente da crise, vamos entregar bons resultados.
FOCUS – Qual tem sido o impacto da Covid-19 na Scania (aqui na África do Sul e globalmente)?
FABIO – Definitivamente, houve um impacto comercial e operacional para nossa organização. No entanto, estamos recuperando o atraso. Abril e maio foram extremamente difíceis. Medimos a quilometragem média em que os veículos estavam rodando. Os veículos aqui rodam a média de 10.000 km por mês. Em abril, isso provavelmente caiu para 2.000 km por mês. Maio foi um pouco melhor – cerca de 4.000 km. Agora estamos em cerca de 9.000 km, então estamos recuperando o atraso.
A Europa está se recuperando mais rápido do que a África do Sul; o nível de entrada de pedidos é alto. A Ásia está de volta aos níveis normais. A América Latina ainda está lutando, mas está se recuperando.
FOCUS – A Scania anunciou grandes cortes globais de empregos em junho. Qual foi o impacto disso na Scania da África do Sul?
FABIO – Em primeiro lugar, não é agradável. Não fico feliz em impactar a vida das pessoas e a sociedade em geral. Assumo total responsabilidade por isso e – quando não há alternativa – você precisa reagir e se ajustar. Precisa ficar mais enxuto e mais eficiente. Claro, há um impacto, mas estamos preparando a Scania para ser mais saudável e forte em 2021.
FOCUS – Como a pandemia afetou a indústria de transporte (aqui na África do Sul e globalmente)? O que a Scania fez para oferecer suporte aos clientes locais durante esse período excepcionalmente difícil?
FABIO – Temos um parceiro muito importante aqui, a Scania Financie. Reescalonamos os pagamentos para clientes com dificuldades. Fizemos um grande esforço para apoiar os clientes durante este período difícil. É assim que deve ser, uma parceria. Precisamos pensar a longo prazo. Todos precisam ser mais eficientes. A crise pode ser uma grande oportunidade. Quando se trata de consumo de combustível, sabemos que somos os melhores da classe; sendo um fenômeno global e é graças ao desenvolvimento do novo caminhão.
Os clientes sabem que um caminhão que não é eficiente pode deixá-los em apuros. Eles estão olhando para o TCO (custo total de operação) como nunca. Nossa rede de revendedores está bem estabelecida e estrategicamente posicionada, além de pronta para oferecer suporte aos clientes.
FOCUS – Os operadores estão recorrendo a caminhões usados ou alugados durante este período desafiador?
FABIO – O desempenho de nosso negócio de aluguel não foi impactado pela crise. Sabemos que a solução de aluguel é ideal para necessidades de curto prazo. Por longos períodos, o aluguel não é a solução. Infelizmente, não existem estatísticas oficiais referentes aos usados, mas o mercado não foi afetado pela crise.
FOCUS – A Covid-19 levou a Scania a atrasar o lançamento de algum produto ou extensão de produto?
FABIO – Na verdade, não. Tivemos muita sorte com o nosso timing, com o lançamento do novo caminhão no ano passado. Nada foi planejado para este ano.
FOCUS – Quanto tempo você planeja permanecer na África do Sul?
FABIO – Em novembro, estarei aqui por um ano. Meu contrato expira dois anos depois disso. Mas, na minha opinião é que quanto mais você fica, mais você entrega. Além disso, gosto de fazer parte da cultura. No dia que eu partir, serei um pouco mexicano, brasileiro e sul-africano também.
FOCUS – Qual legado você gostaria de deixar nesse mercado?
FABIO – Em primeiro lugar, gostaria de deixar a organização mais forte possível. Gostaria que o nosso mercado fosse referência em todas as áreas do nosso negócio. Quero que todos percebam que realmente nos preocupamos com nossos clientes. Se eu puder embutir isso na mente das pessoas, eu fiz meu trabalho.
FOCUS – Por fim, quais são as suas perspectivas para o futuro da Scania África do Sul e da indústria de transporte sul-africana em geral?
FABIO – O que vejo na indústria é muita pressão sobre a lucratividade. Isso não é exclusivo do nosso setor. Não será fácil manter os lucros. Isso fará com que o setor seja mais profissional e se preocupe mais com os pequenos detalhes que podem afetar os resultados financeiros. Isso encorajará as empresas a treinar melhor seus motoristas porque os lucros serão reduzidos. Quando se trata de Scania, estou extremamente confiante. Temos uma base sólida como empresa e uma forte rede de concessionários. Temos as pessoas e os produtos certos no local. Acho que a Scania vai melhorar sua posição nesta região. Temos tudo pronto para chegar lá.
Leia mais: Lançamento do motor Scania V8
Mais informações sobre o transporte na África do Sul: FOCUS ON TRANSPORT AND LOGISTICS